Sutra de Vimalakirti

domingo, 24 de junho de 2007

9. A porta do Dharma da não dualidade

Então, o Licchavi Vimalakirti perguntou àqueles bodhisattvas, “Bons senhores, por favor, expliquem como os bodhisattvas entram na porta do Dharma da não dualidade!"

O bodhisattva Dharmavikurvana declarou, “Nobre senhor, produção e destruição são dois, mas o que não é produzido e não acontece não pode ser destruído. Assim a obtenção da tolerância do não nascimento das coisas é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Srigandha declarou, “ 'eu' e 'meu' são dois. Se não houver nenhuma presunção dum eu, não haverá nenhuma possessividade. Assim, a ausência de presunção é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Srikuta declarou," 'Corrupção' e 'purificação' são dois. Quando houver conhecimento completo da corrupção, não haverá nenhuma vaidade sobre a purificação. O caminho que conduz à conquista completa de toda a vaidade é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Bhadrajyotis declarou", 'Distração' e 'atenção' são dois. Quando não houver nenhuma distração, não haverá nenhuma atenção, nenhuma atividade mental, e nenhuma intensidade mental. Assim, a ausência de intensidade mental é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Subahu declarou, ” 'Espírito Bodhisattva' e 'espírito discípulo' são dois. Quando ambos são vistos para se assemelharem a um espírito ilusório, não há nenhum espírito bodhisattva, nem qualquer espírito discípulo. Assim, a uniformidade das naturezas dos espíritos é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Animisa declarou", 'Cobiça' e 'não cobiça' são dois. O que não é cobiça não é percebido, e o que não é percebido, nem não é presumido, nem é repudiado. Assim, a inação e não envolvimento de todas as coisas são a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Sunetra declarou, “ 'Singularidade' e 'falta de caráter' são dois. Não presumir ou construir algo, não é; nem estabelecer a sua singularidade, nem estabelecer a sua falta de caráter. Penetrar a igualdade destes dois é entrar na não dualidade."

O bodhisattva Tisya declarou", 'Bom' e 'mau' são dois. Não buscando nem o bom, nem o mau, a compreensão da não dualidade, do significado e do sem sentido, é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Simha declarou", 'Perversidade' e 'não pecado' são dois. Por meio da sabedoria do diamante, que trespassa rápido, não estar preso ou libertado, é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Simhamati declarou, “Dizer, 'Isto é impuro' e 'isto é imaculado' traz dualidade. O que, atingindo a equanimidade, não forma nenhuma concepção de impureza ou imaculabilidade, e, contudo, não está completamente sem concepção, tem equanimidade sem qualquer objetivo de equanimidade - ele entra na ausência dos laços conceptuais. Assim, ele entra na não dualidade."

O bodhisattva Suddhadhimukti declarou, “Dizer, 'Isto é felicidade' e 'Isto é miséria' é dualismo. O que está livre de todos os cálculos, pela pureza extrema da gnose - a mente dele é indiferente, como o espaço vazio; e assim ele entra na não dualidade."

O bodhisattva Narayana declarou, “Dizer, 'Isto é mundano' e 'isto é transcendental' é dualismo. Este mundo tem a natureza da vacuidade, assim não há nem transcendência nem envolvimento, nem progressão, nem paralisação. Assim, nem transcender nem ser envolvido, nem ir nem ficar - esta é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Dantamati declarou, “ ‘Vida' e 'libertação' é dualismo. Tendo visto a natureza da vida, nenhuma pessoa pertence a ela, nem é totalmente liberto dela. Tal compreensão é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Pratyaksadarsana declarou, "' Destrutível' e 'indestrutível' é dualismo. O que é destruído é finalmente destruído. O que é finalmente destruído, não se torna destruído; consequentemente, é chamado 'indestrutível.' O que é indestrutível é instantâneo, e o que é instantâneo é indestrutível. A experiência desta maneira, é chamada 'a entrada no princípio da não dualidade.'"

O bodhisattva Parigudha declarou, "' Eu' e 'carência de eu' é dualismo. Como a existência do eu não pode ser percebida, o que lá será feito 'sem eu?' Assim, o não dualismo da visão da natureza deles, é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Vidyuddeva declarou, "' Conhecimento' e 'ignorância' é dualismo. As naturezas da ignorância e do conhecimento são as mesmas, para a ignorância é indefinido, incalculável, e além da esfera do pensamento. A realização disto é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Priyadarsana declarou, "A matéria em si é vazia. A vacuidade não é o resultado da destruição da matéria, mas a natureza da matéria é ela mesma vazia. Então, falar de vacuidade por um lado, e de matéria, ou de sensação, ou de intelecto, ou de motivação, ou de consciência por outro - é totalmente dualismo.

A consciência é em si mesma vacuidade. Vacuidade não é o resultado da destruição da consciência, mas a natureza da consciência é ela mesma vacuidade. Tal entendimento dos cinco agregados compulsivos e o conhecimento deles, tal como, por meio da gnose é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Prabhaketu declarou, dizer que os quatro elementos principais são uma coisa, e o espaço, elemento etéreo, é outra, é dualismo. Os quatro elementos principais são a natureza de espaço. O próprio passado também é a natureza do espaço. O próprio futuro também é a natureza do espaço. Igualmente, o próprio presente também é a natureza do espaço. A gnose que penetra os elementos deste modo é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Pramati declarou, "' Olho' e 'forma' é dualismo. Entender o olho corretamente, e não ter apego, aversão, ou confusão com respeito à forma - isso é chamado 'paz.' Da mesma forma, 'orelha' e 'som,' 'nariz' e 'cheiro,' 'língua' e gosto', 'corpo' e toque', e 'mente' e 'fenômenos’ - todos são dualismo. Mas conhecer a mente, e não ser apegado, nem oposto, nem confuso com respeito aos fenômenos - isso é chamado 'paz.' Viver em tal paz, é entrar na não dualidade."

O bodhisattva Aksayamati declarou, "A dedicação da generosidade, como meio de atingir a onisciência é dualismo. A natureza da generosidade é, em si, onisciência, e a natureza de onisciência, ela mesma, é dedicação total.

Igualmente, é dualismo dedicar moralidade, tolerância, esforço, meditação, e sabedoria, por causa da onisciência. A onisciência é a natureza da sabedoria, e a dedicação total é a natureza da onisciência. Assim, a entrada neste princípio de singularidade é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Gambhiramati declarou, "É dualismo dizer que vacuidade é uma coisa, a carência de sinais, outra, e a carência de desejos ainda outra. O que é vazio não tem nenhum sinal. O que não tem nenhum sinal, não tem nenhum desejo. Onde não há nenhum desejo, não há nenhum processo de pensamento, mente, ou consciência. Ver as portas de todas as libertações na porta de uma libertação é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Santendriya declarou, "É dualidade dizer, “ 'O Buda,' 'Dharma,' e 'Sangha.' O Dharma é a natureza do Buda, o Sangha é a natureza do Dharma, e todos eles são não compostos. O não composto é espaço infinito, e os processos de todas as coisas são equivalentes ao espaço infinito. Ajustar tudo isto é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Apratihatanetra declarou, “ É dualidade referir-se a agregados’ e a 'cessação dos agregados.' Os agregados são cessação em si mesmos. Porquê? Os pontos de vista egoístas dos agregados, sendo eles mesmos, não produzidos, não existem no fim de contas. Consequentemente tais pontos de vista realmente não fazem a conceitualização de 'Estes são agregados’ ou 'Estes agregados cessam.' No fim de contas, eles não têm tal construção discriminativa e nenhuma tal conceitualização. Então, tais pontos de vista têm em si mesmos a natureza da cessação. A não ocorrência e a não destruição são a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Suvinita declarou,” Os votos; físicos, verbais, e mentais não existem dualisticamente. Porquê? Estas coisas têm a natureza da inatividade. A natureza da inatividade do corpo, é igual à natureza da inatividade da fala, cuja natureza da inatividade, é igual, à natureza da inatividade da mente. É necessário saber e entender este fato da inatividade ultima de todas as coisas, este conhecimento é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Punyaksetra declarou, "É dualidade considerar as ações, em meritórias, pecaminosas, ou neutras. O não empreendimento de ações meritórias, pecaminosas, e neutras é não dualismo. A natureza intrínseca de todas as ações é a vacuidade, onde em ultimo caso, não há nenhum mérito, nem pecado, nem neutralidade, nem ação. A não realização de tais acepções é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Padmavyuha declarou, "O dualismo é produzido da obsessão com o eu, mas o verdadeiro entendimento do eu não resulta em dualismo. Quem assim permanece, na não dualidade, está sem ideação, e aquela ausência de ideação é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Srigarbha declarou, "A dualidade é constituída pela manifestação perceptual. A não dualidade é não objetiva. Então, o não apego e a não rejeição é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Candrottara declarou, "' Escuridão' e 'luz' é dualismo, mas a ausência de ambos, escuridão e luz, é não dualidade. Porquê? No momento da absorção na cessação, não há nem escuridão nem luz, e do mesmo modo, com as naturezas de todas as coisas. A entrada nesta equanimidade é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Ratnamudrahasta declarou, "É dualidade detestar o mundo e alegrar-se na liberação, e nem detestar o mundo, nem alegrar-se na libertação são, não dualidade. Porquê? A libertação pode ser encontrada onde há escravidão, mas onde há, não escravidão, onde está a necessidade da libertação? O mendigo que não é nenhum cioso ou libertador, não experimenta qualquer gostar ou qualquer antipatia e assim ele entra na não dualidade."

O bodhisattva Manikutaraja declarou, "É dualidade falar de caminhos bons e caminhos maus. Quem está no caminho, não está preocupado com bons ou maus caminhos. Vivendo em tal despreocupação, ele não se entretém com nenhum conceito de 'caminho' ou 'não caminho.' Entendendo a natureza dos conceitos, a mente dele não se ocupa de dualidade. Tal é a entrada na não dualidade."

O bodhisattva Satyarata declarou, "É dualidade falar de 'verdadeiro' e 'falso.' Quando a pessoa verdadeiramente vê, a pessoa nunca vê qualquer verdade, assim; como se pode ver falsidade? Porquê? A pessoa não vê com o olho físico, a pessoa vê com o olho da sabedoria. E com o olho da sabedoria a pessoa só vê na medida em que, não há visão, nem não visão. Lá, onde não há nem visão nem não visão, é a entrada na não dualidade."

Quando os bodhisattvas deram as suas explicações, todos eles dirigiram-se ao príncipe coroado Manjusri: "Manjusri, qual é a entrada dos bodhisattvas na não dualidade?"

Manjusri respondeu: “Bons senhores, todos vocês falaram bem. Não obstante, todas as vossas explicações são em si mesmas dualidade. Não conhecer nenhum ensinamento, não expressar nada, para não dizer nada, não explicar nada para não anunciar nada, não indicar nada e não designar nada - isso é a entrada na não dualidade."

Então o príncipe coroado Manjusri disse ao Licchavi Vimalakirti, "Todos nós temos dado os nossos próprios ensinamentos, nobre senhor. Agora, possa você elucidar-nos no ensino, da entrada no princípio, da não dualidade!"

Após isto, o Licchavi Vimalakirti manteve-se em silêncio, não dizendo nada.

O príncipe coroado Manjusri aplaudiu o Licchavi Vimalakirti: "Excelente! Senhor excelente, nobre! Esta realmente é a entrada na não dualidade dos bodhisattvas. Aqui não há nenhum uso para sílabas, sons, e idéias.”

Quando estes ensinamentos foram declarados, cinco mil bodhisattvas entraram na porta do Dharma da não dualidade e atingiram a tolerância do não nascimentos de coisas.